Dentre as boas descobertas dos últimos dias, o livro do colombiano Efraim Medina Reyes, Era uma vez o amor, mas tive que matá-lo já está na minha lista de leitura para o ócio criativo. O título é maravilhoso e o capítulo que li, indicação de um querido amigo, é um verdadeiro deleite, coisa que somente as boas leituras proporcionam.
Em especial, publico aqui a parte que fala sobre alguns motivos que levam Efraim à esrita. É bom saber que temos muito em comum. Quem se arrisca em traçar suas próprias linhas com certeza vai entender porque!
A gente se mete a escrever porque não foi capaz de bater num motorista que nos afrontou na rua, porque não quebrou pratos num restaurante, porque não enfrentou um policial louco que xingou sua namorada, porque não cuspiu num professor que dizia que a Terra é redonda, porque deixou que pegassem seu lugar na fila do cinema, porque não tem ofício nem benefício, porque pensa que é uma forma fácil de fazer fama e dinheiro, porque se paspalhos como García Márquez e Mutis fazem isso, a gente também pode fazer, porque não é bom em matemática, porque não quer ser médico nem advogado, porque está irado, porque odeia as pessoas e quer insultá-las.
A gente se mete a escrever porque uma garota linda lhe disse que gostava de escritores, porque precisa de um álibi para não trabalhar, porque isso o faz sentir-se superior, porque leu uns romances de caubóis e quer entrar na concorrência, porque é um caubói sem Oeste, porque escriturários como Vargas Llosa o fazem, porque não tem voz, porque não tem ritmo, porque está farto de bater punheta, porque quer trepar com uma mulher mas não sabe como, porque pensa que tem alguma coisa a dizer, porque descobre que as garotas bonitas dizem que os escritores são ternos mas saem com mafiosos, porque não deixam dar um amasso na ganhadora do concurso nacional de beleza, porque é magro e não tem remédio, porque tem medo de morrer sem ter metido numa garota linda, porque se um puxa-saco hipócrita como Vargas Llosa escreve qualquer um pode fazê-lo, porque sabe que o cinema é tempo perdido, porque tem inveja dos micos que aparecem na tela e ganham milhões, porque na falta de melhores oportunidades quer ser como Bukowski.
A gente se mete a escrever porque não sabe lutar boxe nem tem colhões para isso, porque tem os dentes tortos e não pode sorrir como gostaria, porque para os impotentes de todo tipo não há outro caminho, porque todos os feios escrevem ou assassinam e a gente não é capaz de matar nem uma mosca, porque escrever dá importância, porque para chamarem alguém de escritor não é preciso escrever bem, mas para chamarem de filho-da-puta não importa se sua mãe é uma santa, porque tem medo de ficar à deriva sem fazer nada, porque não pode beber toda noite, porque ama a Deus mas odeia as sociedades sem fins lucrativos, porque não tem namorada, porque não há emoções mas insultos, porque na sua casa não tem televisão e o rádio quebrou, porque a mulher do vizinho é gostosa, porque tem medo de ficar careca e por isso evita os espelhos. A gente se mete a escrever porque não se atreve a assaltar um supermercado, porque ama a mulher e ela é namorada do garoto esperto da rua, porque não há revistas pornográficas suficientes, porque quer fazer alguma coisa além de cagar e se masturbar, porque não é o garoto esperto da rua nem o garoto forte nem o engraçado, porque é o garoto nada, porque não vale um tostão furado, porque apanha lá fora, porque sua mãe grita o tempo todo, porque não há ilusões nem luz no fim do túnel, porque sua mãe grita o tempo todo, porque sua mente voa baixo e nunca será outro Cioran, porque não tem coragem para saltar, porque não quer a esposa feia que merece, porque tem medo de morrer sem ter comido um belo cuzinho, porque não tem pai, amigos, nem fortuna, porque não tem o jeito de cuspir do Clint Eastwood, porque se paralisa entre uma e outra intenção, porque era uma vez o amor mas eu tive que matá-lo.
O bom é que escrever não serve para nada daquilo que a gente quer. Escrever é um limite, uma dor, um defeito a mais. O bom é que depois de escrever a gente se sente péssimo. Nada mudou, tudo continua no seu lugar (menos você, maldito cabelo), Pelé não volta para o campo. O ruim é que você escreve e o Pambelé cai na lona espancado por um gringo, um maldito gringo que esteve preso por bater na mãe. O ruim é que Pambelé não é a mãe do gringo e – por mais que você escreva – continua caído. O bom é que você escreve e continua sonhando com a mulher do vizinho, sonha que a agarra pelas orelhas e crava-lhe a rola. O ruim é que escrever não cura seus desejos assassino, que assaltar um supermercado continua sendo o seu objetivo impossível. O ruim é que ainda deseja um amor inesquecível. O bom é que escrever é outra forma de cagar e se masturbar. O ruim é que você lê os grandes autores mas só Bukowski lhe diz alguma coisa. O ruim é que um dia a garota bonita toma conhecimento que você escreve e não deixa que lhe meta fundo, até o outro lado da morte. O ruim é que escrever serve para tudo aquilo que você não quer.
- Oi, mãe.
- OH MEU DEUS, Rep: o seu sapato está SUJO DE MERDA.
- Não grite, vou limpar o chão.
- Saia daí, VOLTE POR ONDE VEIO.
- Tá bom, mamãe, mas não grite.
- NÃO ESTOU GRITANDO.
3 comentários:
Vc teria esse livro em pdf ou epub? A um tempo q procuro
Eu comprei o livro na ápoca. Tentei achar o PDF pra postar aqui, mas não encontrei.
Ok, vou ver se consigo achar para comprar, obrigado por responder.
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