quinta-feira, janeiro 30, 2014

Machado de Assis sempre surpreendendo!

Estou relendo "Memórias póstumas de Brás Cubas", ai me deparo com um trecho no qual Machado de Assis, em 1881, fala sobre como os oprimidos reproduzem atos do opressor, simplesmente porque não conhecem outro jeito de viver. 

Vale pra quando alguém diz que negro também é racista, vale pra quando alguém diz que mulher é machista. Explica policial negro sendo violento com a juventude negra periférica. Não é escolha, é manutenção do sistema opressor e não é por acaso. 

Sabe quando eu sacaria esse trecho com 17 anos? Nunca! Decidi que tenho que reler toda a lista do vestibular. Quanta coisa vou entender de outra maneira! A lei da abolição só seria promulgada em 1888, o cara estava adiantadíssimo no tempo! E que sarcasmo! Ah, beijo, Machadão!


... um preto que vergalhava outro na praça.
- Toma, diabo! - dizia ele; toma mais perdão, bêbado!
Parei, olhei ... Justos céus! Quem havia de ser o do vergalho? Nada menos que o meu moleque Prudêncio - o que meu pai libertara alguns anos antes. Cheguei-me; ele deteve-se logo e pediu-me a benção; perguntei-lhe se aquele preto era seu escravo.
- É, sim, sinhô.
- Fez-te alguma coisa?
- É um vadio e um bêbado muito grande. Ainda hoje deixei ele na quitanda, enquanto eu ia lá embaixo na cidade, e ele deixou a quitanda para ir na venda beber.
- Está bom, perdoa-lhe - disse eu.
- Pois, não, nhonhô. Nhonhô manda, não pede. Entra para casa, bêbado!

(...) Era um modo que Prudêncio tinha de se desfazer das pancadas recebidas - transmitindo-as a outro. Eu, em criança, montava-o,punha-lhe um freio na boca, e desancava-o sem compaixão; ele gemia e sofria. Agora, porém, que era livre, dispunha de si mesmo, dos braços, das pernas, podia trabalhar, folgar, dormir, desagrilhoado da antiga condição, agora que ele se desbancava: comprou um escravo, e ia-lhe pagando, com alto juro, as quantias que de mim recebera. Vejam as sutilezas do maroto!




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